Quando falamos de Holding nas edições anteriores, restou possível vislumbrar que as estruturas analisadas se referiam à criação de pessoa jurídica e, a partir disto, a formatação do negócio em conformidade com o ideal almejado pelo planejador.
Entretanto, em estruturas mais ousadas, é possível a utilização de Sociedade em Conta de Participação – SCP – em diversos formatos de negócios. Mas antes de observarmos algum desses formatos, é necessário estabelecermos do que se trata a Sociedade em Conta de Participação.
Sociedade em Conta de Participação
Grandes pensadores do Direito divergem quanto à verdadeira natureza jurídica da Sociedade em Conta de Participação: há os que argumentam se tratar de mero contrato e há os que lecionam ser a mesma uma sociedade.
O Código Civil estabelece em seu art. 993 que a Sociedade em Conta de Participação, sob qualquer pretexto, adquirirá personalidade jurídica. Com isto, a classificamos como uma sociedade despersonificada (sem personalidade jurídica).
Com os argumentos acima resta claro que nos filiamos à corrente que entende ser a SCP um tipo societário como qualquer outro: sociedade limitada, sociedade anônima, sociedade em comandita, etc.
A consequência prática de tal entendimento é atribuir à Sociedade em Conta de Participação todas as regras do Direito Societário e não as abrangentes regras do Direito Contratual, o que, em estruturas mais sofisticadas de negócios, não se tornaria o melhor instrumento.
Com isto, a SCP é um tipo societário, despersonificado, regulado pelo Código Civil e pelo instrumento constitutivo da mesma, este, de fato, o mais importante. Dizemos que o instrumento de constituição de uma SCP é o mais importante, pois o Código Civil pouco regulamentou referido tipo societário, permitindo grande possibilidade de criação de regras pelas partes contratantes.
Tal entendimento advém do disposto no art. 996 do Código Civil, que estabelece que as regras fixadas pelas partes terão preponderância sobre outras regras, e, em caso de omissão, aplicar-se-ão as regras da Sociedade Simples, esta sim, muito regulada pelo Código Civil.
A boa redação do instrumento constitutivo da SCP é o que garante o sucesso do negócio, a ausência de conflitos e a maximização de ganhos financeiros para todas as partes envolvidas.
Estrutura da SCP
Basicamente a Sociedade em Conta de Participação possui duas categorias de sócios: o sócio ostensivo, que é aquele que exerce realmente a atividade econômica em seu próprio nome; e o sócio participante, antigamente chamado de sócio oculto, que entrega ao sócio ostensivo os meios para o exercício da atividade econômica. Muitas das vezes, o sócio participante é o investidor do negócio, que garante o necessário fluxo financeiro para crescimento e em troca recebe uma participação nos lucros daquela atividade.
Por ser uma sociedade, o sócio participante, nos estritos limites das disposições do instrumento constitutivo, também poderá participar das perdas. Ou seja, participa efetivamente como sócio nos limites do contrato, tanto partilhando as perdas como os lucros.
Essa estrutura simplificada e com regras eminentemente contratuais entre as partes, sem a necessidade de registro prévio com uma empresa propriamente dita, possibilita o fluxo legal e regular altos valores, possibilitando o incremento e crescimento de vários negócios.
Vale destacar, entretanto, que a SCP, por expressa determinação da Receita Federal do Brasil, é obrigada a se inscrever no CNPJ, embora tal inscrição não implique em criação de uma pessoa jurídica. Tal inscrição é tão somente para fins tributários.
Como uma SCP pode ser usada em reorganizações empresariais?
A simplicidade da formação da SCP permite sua utilização em vários modelos de negócios. Ademais, como sua constituição não demanda registro, sua utilização demonstra-se extremamente vantajosa, por ter um reduzidíssimo custo de manutenção.
Além do baixo custo de manutenção, a ampla flexibilidade de suas regras permite a acomodação de vários interesses dos sócios, inclusive do sócio participante, que, geralmente, investiu considerável valor em determinada atividade econômica.
Com uma ampla flexibilidade, é possível que uma SCP “funcione” como uma verdadeira Holding, ainda que não detenha personalidade jurídica. Isto se daria observando as regras estabelecidas no instrumento de constituição, principalmente quando o poder decisório é concentrado na própria SCP, compartilhando os sócios ostensivos e participantes das tomadas de decisões estratégicas sobre os rumos do próprio sócio ostensivo, que se transformaria numa espécie de controlado pela SCP.
Vale destacar que existe proibição legal (art. 993, do Código Civil) que o sócio participante tome o lugar do sócio ostensivo nas relações com terceiros. O compartilhamento de tomada de decisões na SCP não pode implicar na usurpação das funções do sócio ostensivo, sob pena de caracterização de fraude.
Holding e SCP
Como se pode observar, até mesmo uma sociedade sem personalidade jurídica pode assumir funções de verdadeira Holding, na medida que os sócios assim estabeleçam no ato constitutivo. A ampla liberdade de estruturação de Sociedade em Conta de Participação permite sua utilização em diversos negócios.
A estruturação de negócios com a utilização de SCP demanda sólidos conhecimentos de Direito Societário, com a melhor formatação do instrumento constitutivo e de outros que se mostrarem necessários para os negócios.